A experiência de ensinar os pobres na Colômbia tem lições para o mundo, diz Shakira, fundadora da Barefoot Foundation
Nove anos atrás, na Cúpula do Milênio, na sede das Nações Unidas, em Nova Iorque, chefes de estado de todo o mundo concordaram na Declaração do Milênio de reduzir a pobreza. Um dos objetivos era assegurar que, em 2015, toda criança poderia completar a escola primária. Isto significa que todos aqueles que estiverem terminando a escola primária em 2015, entrarão nela em 1010. É uma meta assustadora, mas se o G8, o G20 e outras nações se unirem para estabelecer um fundo global para a educação, conseguiremos fazer avanços com relação a este prazo.
Barack Obama prometeu o apoio dos Estados Unidos para criar este novo fundo de 2 bilhões de dólares há cerca de um ano atrás. Um modelo semelhante já existe. O fundo será uma instituição independente e inovadora similar ao fundo global de combate à AIDS, Tuberculose e Malária. Ele incluirá representantes da sociedade civil, de países em desenvolvimento e das nações doadoras em sua estrutura de governo em partes iguais, garantindo credibilidade ao modo como os fundos são gastos.
Muita coisa está em jogo. Nos últimos 2 anos, cerca de 600 escolas no Afeganistão foram bombardeadas, incendiadas ou derrubadas por extremistas. 80 % destas escolas eram escolas para meninas. Por que? Porque a educação de uma criança é a forma mais ponderosa de segurança nacional – e é por isto que é uma ameaça tão grande para militantes em todo lugar.
Para mim, isto não é teoria. Crescendo na Colômbia depois de décadas de conflito, eu vi que as pessoas que nascem pobres, morrem pobres. Com raras exceções, elas nunca têm a chance de melhorar sua qualidade de vida.
Essas pessoas têm dificuldade em encontrar empregos decentes e fazer uma vida decente e frequentemente acabam se envolvendo com coisas que nunca imaginaram. Nenhuma criança sonha em ser um traficante ou um militante, mas nos países em desenvolvimento, às vezes a vida não te dá outra opção.
Educação, educação, educação
A educação é a única maneira de quebrar este circulo vicioso. Mas no mundo atual, ainda existem 72 milhões de crianças que não têm a oportunidade de ir à escola e 226 milhões de adolescentes que não têm a oportunidade de freqüentar a escola secundária.
Minha fundação na Colômbia, Pies Descalzos, tem provado que as crianças mais pobres podem ser educadas. Por menos de dois dólares por dia por criança, nossas escolas oferecem comida, educação, e serviço de aconselhamento para milhares de alunos. Nossas escolas ajudam crianças desprivilegiadas a crescerem de maneira sustentáveis e as auxiliam com as ferramentas de que precisam para quebrar o círculo vicioso da pobreza.
Muitas pessoas não percebem que a Colômbia tem uma das maiores populações desabrigadas do mundo. Mais de três milhões de pessoas no país (de um total de 49 milhões) deixaram suas casas por causa de conflitos. Por esta razão, decidimos que nossos programas deveriam focar especificamente em servir estas crianças desabrigadas.
Nosso trabalho na Colômbia combina educação acadêmica de alta-qualidade com recreação, atendimento médico e acompanhamento psicológico. Nós operamos seis escolas em três regiões distintas da Colômbia: Barranquilla, Quibdó e Altos de Cazucá. Mais de cinco mil crianças são atendidas diretamente em nossas escolas, mas aproximadamente 30 mil crianças se beneficiam de nossos programas. Por exemplo, trabalhando no combate à desnutrição, nós não apenas oferecemos refeições nutritivas aos nossos alunos, como também oferecemos informações cruciais sobre saúde e nutrição a seus pais.
Além dos serviços relacionados à saúde física, os programas da fundação abrangem a saúde emocional através de aconselhamento e exposição às artes, assim como aconselhamento familiar e aulas para os pais.
Também ajudamos a comunidade como um todo. Todos os dias nossas escolas estão cheias de atividades, oferecendo uma ampla gama de serviços que incluem alfabetização de adultos, aulas de liderança na juventude, acesso a bibliotecas e aulas de computação. Talvez o mais importante, também começamos a formar cooperativas de pais cujo foco é ensinar a eles atividades que de fato possam gerar renda para assegurar que as famílias estejam financeiramente seguras.
Agora estamos no processo de levar esta história de sucesso a outras partes do mundo através de nossa organização não governamental Barefoot Foundation, nos Estados Unidos.
Se nossa fundação pode levar educação de qualidade para algumas das crianças mais pobres do mundo, não há razão pela qual os governos não possam fazer o mesmo. Nossas escolas na Colômbia estão provando todos os dias que não importa de onde venha uma criança ou o quão pobre seja, ela pode triunfar se for dada uma chance.
Me recuso a acreditar que não é possível educar todas as crianças. Estabelecendo um Fundo Global de Educação em 2010, investiremos no futuro destas crianças – e ajudaremos a assegurar nossos próprios.