Quando eu tinha uns 6 anos, meu pai me ensinou que eu poderia identificar qual o público-alvo de um programa de TV prestando atenção nos intervalos comerciais.
Os programas que eu assistia na época – desenhos animados no sábado de manhã e “Vila Sésamo” – exibiam propagandas de brinquedos e cereais para o café da manhã. E fiquei com a vaga lembrança de que os noticiários que meu pai assistia vinham com anúncios de carros e bancos.
Assim como as propagandas, os perfumes assinados por celebridades estão direcionados para um determinado público: os fãs dessas celebridades, aqueles que compram seus discos, assistem seus filmes ou os acompanham nos esportes. Essas fragrâncias geralmente revelam seus célebres criadores com uma força e uma brutalidade de tirar o fôlego. A qualidade do perfume reflete a qualidade da pessoa que o inspirou e o desenvolveu. Posso mostrar certa falta de delicadeza ao dizer isso, mas nem todas as celebridades são criadas igualmente – nem o resto de nós, aliás – e muito menos são seus perfumes. Às vezes me pego espantado com a imensa diferença entre minhas impressões de determinada celebridade e a qualidade do perfume que leva o seu nome.
Reese Witherspoon, por exemplo, é uma atriz tipo A, mas seu perfume é um completo lixo. Ao contrário, a fragrância de 50 Cent é realmente muito boa: masculina, criada em boa parte como se tivesse seguido uma receita, mas passa a sensação de algo sólido, além de ter sido feita com matérias-primas de boa qualidade. Os perfumes de Sean Combs, criados para sua linha Sean John, são bem concebidos, benfeitos e melhores que a maioria dos masculinos no mercado. Enquanto isso, os perfumes de Queen Latifah e Halle Berry são definitivamente esquecíveis. O de Derek Jeter é um clichê de todo masculino metálico que foi criado desde 1970, mas está perfeitamente regulado para seus fãs. O de Patrick Dempsey é um clichê masculino desprezível, que me deixa curioso sobre o que seu empresário pensava enquanto fechava esse negócio. Os perfumes de Sarah Jessica Parker e Jennifer Lopez são interessantes e maduros. A bugiganga olfativa de Kylie Minogue é prazer puro. A primeira fragrância de Hillary Duff é muito boa. A de Shania Twain é péssima.
Shakira Mebarak tem um dos mais diversificados grupos de fãs dentre as popstars – linguística, cultural, socioeconômica e esteticamente. E, ao contrário do perfume de alguém como Derek Jeter, que qualquer um poderia prever que seria uma máquina máscula, cromada e sem alma, não foi fácil prever que tipo de perfume a Shakira iria lançar.
Talvez seja injusto o fato de, entre os perfumes lançados por celebridades – diferente dos perfumes de designers de moda –, os desastres serem mais lembrados do que os sucessos. Talvez porque os perfumes de celebridades estejam mais associados a determinada pessoa, enquanto os designers estão escoltados por selos, marcas, etc. Um verdadeiro desastre na perfumaria é tóxico. Os dois produtos de Pamela Anderson são (ou foram, passado, já que não posso imaginar ninguém ainda usando aquilo) ainda piores que lixo. Eram lixos químicos sem processamento, que não foram classificados nem como baratos, quiçá poderiam ser chamados de perfumes. É a lembrança de fragrâncias como aquelas que faz com que as pessoas se abracem, de medo, quando uma nova fragrância assinada por alguma celebridade surge no horizonte.
A própria Shakira detém o título de diretora criativa de S by Shakira. E eu espero que ela realmente tenha tido alguma coisa a ver com a função, porque sou um grande fã, não tanto por sua música mas por seu trabalho notável a favor dos menos favorecidos e pela sua determinação em melhorar a educação. S, no fim, é um bom perfume, perfeito para o mercado de massa da cultura pop: suave mas sem deixar de ter personalidade, universalista no estilo. Seu cheiro parece o do Gold, de Donna Karan – o cheiro do luxo como imaginado por fãs de programas de TV sobre os ricos. Ele invoca tanto o aroma vistoso e doce de um buquê de copos de leite e (metaforicamente falando) o ouro chapeado do vaso. É o cheiro de uma mulher que tem bastante dinheiro, muita paz e sossego, várias coisas boas. Em outras palavras, S é aspiracional. É também notavelmente reconfortante.
Entre seus três perfumistas está Olivier Cresp, um dos maiores peso-pesados da indústria. Ele criou inúmeros sucessos, entre eles Angel, de Thierry Mugler e Light Blue de Dolce & Gabbana. Cresp pode perfeitamente ser o responsável pelo sucesso técnico de S, que fixa maravilhosamente na pele, difunde bem e possui uma ótima estrutura, que combina com a pele perfeitamente durante horas. Mas a parte aspiracional parece ter vindo da própria Shakira, que é uma mulher notável e de muito sucesso em várias frentes. Ela também é muito compassiva – o que talvez explique o surpreendente conforto e bem-estar que seu perfume carrega.
Para saber mais acesse o site: http://www.pt.shakira-beauty.com/
por Chandler Burr, do “The New York Times”