A Vida Dupla de Shakira
Por Pablo Sirven / La Nación
Quase não há um dia em que Shakira não produza uma notícia. A colombiana mais conhecida do mundo, que acaba de completar a idade de Cristo, dá um jeito de ter um lugar habitual não apenas nas páginas de espetáculos, de forma que começa a saltar com cada vez mais frequências às seções internacionais e de política.
Shakira presidente? De seu país, pelo menos, não. E tomara que nunca se candidate. Mas ela já é de uma potente fundação social que construiu cinco escolas e que se ocupa da educação e nutrição de mais de cinco mil crianças e que leva o nome de um de seus sucessos musicais ( Pies descalzos ), a mesma fundação que agora tem uma versão norte-americana e que se comprometeu a construir uma escola no Haiti. Ela também é embaixadora oficial da UNICEF e desde o mês passado, da 1Goal, outra campanha internacional para assegurar que cada criança tenha direito a educação, criada pela rainha Rania da Jordania e apoiada pela FIFA.
Assim como em algum momento falava-se da capacidade de Michael Jackson de ser onipresente (e a lenda consistia no fato de haver vários clones que o representavam), em alguns momentos tem-se a sensação de que há mais de uma Shakira.
Desde que, pouco antes do meio do ano passado, começou a campanha fracassada de lançar Loba através de um “mistério” (com cerca de dez minutos, todos já sabiam que se tratava dela), seu último disco super-comercializado em diversos capítulos ainda em curso (singles, vídeos, versões em inglês e espanhol, etc), paralelamente, Shakira vem intensificando sua presença em outras altíssimas esferas, sejam elas filantrópicas, políticas ou econômicas.
She Wolf/Loba já vendeu mais de um milhão de cópias no mundo e há alguns dias se revelou o clipe de “Gitana”- mais um dos singles – em que ela aparece acompanhada pelo tenista Rafael Nadal. A faixa integrará a re-edição do álbum, que será lançada no dia 22 deste mês.
Seu rebolado e sua voz faturam milhões e se multiplicam nos rádios e canais de música. Essa é a Shakira sobre a qual os fãs não se cansam de buscar informações na internet e clicam sem parar sobre os últimos e insinuantes vídeos.
Também há outra Shakira que não faz vibrar nem suas cordas vocais nem sua cintura, mas que começa a entusiasmar outros públicos inesperados, que já a vêem com bons olhos, mesmo embora não saibam muito de seus discos nem se deixem levar pelos movimentos sensuais tão afetadamente enfatizados em seu último trabalho
Nos fins de 2009, o jornalista que vos fala começou a reber de distintos remetentes e procedências nada ligadas ao mundo musical um vídeo que, à primeira impressão, alguém poderia pensar mostrar uma irmã gêmea de Shakira, vestida de forma muito sóbria e que se dirige em tom quase acadêmico, sem ler e em inglês fluente, aos alunos da Universidade de Oxford, em 6 de dezembro passado. Seu discurso é sumáriamente potente ( comprove você mesmo http://www.youtube.com/watch?v=2yRm3GCZ2U4 ). Mas não, é a mesma, que parece parodiar a si mesma em um clipe em que ofega enfiada em um maiô cor de pele dentro de uma jaula. Aqui, diferentenmente, usa um vestido rosa suave e um casaquinho negro. Nada loba, desprende um atraente candor femino que não a impede de se expressar com grande destreza política.
Neste discurso, advertiu que não haveria “nem músicas nem remexer de quadris” e a frase mais provocante que disse foi “Quero que a juventude de 2060 veja que nossa missão pela paz global consistiu em enviar 30 mil educadores ao afeganistão, não 30 mil soldados, e que em 2010 a educação universal será um assunto mais importante que a dominação global”
Embora parecesse se referir ao belicissimo norte-americano, no último dia 22 de fevereiro ela esteve na Casa Branca com o presidente Barack Obama para falar da educação precoce na comunidade hispânica do país e suas respectivas equipes ficaram de se reunir para avançar com o assunto. No mesmo dia, Shakira, representando a organização da qual também é fundadora ( a ALAS), assinaria junto com o presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick, um acordo para que a instuição financie assuntos relacionados à educação nos próximos anos, em quantia que soma 300 milhões de dólares.
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Quem integra o “estado Maior” de Shakira?
Aíto de la Rúa, cunhado da estrela, fala, direto da base de operações de Nova Iorque: “Somos dois empresários para todo o mundo – uma mulher e eu. Cuidamos de todos os assuntos que rodeiam uma carreira como a dela: discos, turnês, contratos, patrocinadores, gravações, licenças, comunicação, divulgação, perfumes, internet, TV, etc. Antônio, além de cuidar de seus assuntos que não dizem respeito à música, também está nesta estratégia global, e há advogados e empresários de negócios que nos ajudam com tudo. Finalmente, há uma equipe de jovens aqui, em Nova Iorque, envolvida na área digital, de pesquisas, comunicação, finanças e novos negócios. E claro, a Sony Music, o selo que tem papel chave em todos os países do mundo, e as marcas e meios que nos acompanham neste ciclo. Viajamos muito para todo lado, de Los Angeles a Madri, e aqui estamos, bem no centro”
Em todo lugar que vai, Shakira bate sempre na mesma tecla: uma obsessão que posta na boca de tecnocratas ou funcionários públicos não teria o mesmo impacto: a necessidade urgente de que o acesso à educação seja universal, como a maneira mais eficaz, direta e justa para erradicar a miséria, promover o crescimento econômico e por a insegurança contra a parede.
“Ela vive nas Bahamas”, explica Aito, “por que lá encontra paz e tranquilidade, além de ter seu estúdio, onde grava muitos de seus discos, embora passe mais tempo viajando do que em sua casa, como todos nós”
Negócios e filantropia divulgada sabiamente unidos podem acabar sendo muito convenientes quando há boa fé. Se Shakira aplicar a mesma lucidez, sentido prático e habilidade que tem para lidar com seus negócios às causas maiores da humanidade, não conquistará pouco.